Tesão no Forró, 1978 / Nair Benedicto

Nada ampara a força criativa humana — vórtice de imagens, sensações e desejos —, criamos, indomáveis criaturas sonhadoras, às margens de nossas vivências: rio onde o eu passeia. Se, dentro da vida, nos vemos diante de enigmas — a fome, a injusta distribuição de tudo, a violência, a dicotomia entre amor e ódio, o medo diante da diferença, a opressão que o sucede —, somos impingidos a exercer nosso arbítrio: silenciar ou combater — ambos atos políticos. Assim, podemos concluir: viver não é, em si, uma ação política, mas existir neste mundo humano, sim. Produzir, no sentido artístico da palavra, é o mecanismo pelo qual as utopias se solidificam, materializadas, confrontando os cimentos da realidade e martelando-os para quebrá-los.

 Indígenas Arara, Altamira, Pará, 1983 / Nair Benedicto

Nair Benedicto situa-se na linha de frente dessa propulsão reformadora. Nascida na capital paulista em 1940, combateu a ditadura militar — tendo sido presa e torturada —, presenciou o caos da ambição em Serra Pelada, percorreu a Amazônia revelando a fome extrativista e a resistência receptiva de diversos povos originários. Das matas aos centros urbanos, onde há gente, sua fotografia explora — nutrida fortemente pelas relações, pela construção narrativa, documental e plástica —, beijando o etéreo ao que se aproxima do espectro da pintura. Sua obra, de protesto e abraço, percorre décadas de uma sociedade que não se resolve, que posterga, ruminando questões sem nunca efetivamente digeri-las.

Louvação a Iemanjá na Praia Grande, Santos-SP, 1978 / Nair Benedicto

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